A LUZ QUE VEM DA DIREITA...
No processo de leitura de alguma bibliografia sobre a história da edição e as peripécias do espólio de Walter Benjamin, fui inesperadamente dar à passagem do «Diário de Paris» (9 de Janeiro de 1930) em que, na conversa com Marcel Jouhandeau, se fala da «magia das condições de trabalho». A sala onde trabalha este autor francês surge a Benjamin como «a perfeita conjugação de atelier e cela monacal», num espaço onde a luz vem de cima e da direita. Jouhandeau, autor católico «que tem visões no ar sufocante de pequenas sacristias francesas» (Benjamin em carta a G. Scholem, de 14 de Fevereiro de 1929), fala da «força inspiradora da luz que vem da direita» (estamos no domínio da topologia, ou da ideologia?).
Walter Benjamin, esse escreveu grande parte dos seus textos em lugares e condições ascéticos e precários: a primeira dissertação, no isolamento de Muri, na Suíça, só com Scholem por interlocutor; o ensaio sobre As Afinidades Electivas na clausura de um quartinho cheio de livros, emprestado por Leo Löwenthal em Heidelberg; o livro sobre o drma do Barroco numa quase cela em Capri; os ensaios sobre Baudelaire numa mansarda austera em Svendborg, lugar de exílio de Brecht na Dinamarca; O Livro das Passagens num cantinho da Biblioteca Nacional de Paris.
A força interior que o sustenta, nos caminhos difíceis do exílio, entre 1933 e 1940, sendo a do intelectual militante – mais do espírito do que das massas –, tem qualquer coisa de ascético e religioso. Religião do pensar, «iluminação profana», cujo breviário eram os seus próprios manuscritos, textos sagrados, arquivados, legados e transmitidos, reproduzidos, com o zelo de quem era um coleccionador e um arquivista nato. É em grande parte devido a esta religião que podemos ler hoje muitos desses textos.
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