CADA OBRA UMA MÓNADA
Só mais de dois meses depois de concluída a tradução do primeiro volume das Obras Escolhidas de Benjamin retomei o trabalho da edição (na parte do Comentário) e este diário. Houve razões de peso para a interrupção. A amizade, a entrega a outros ou a causas em que se acredita, são razões mais do que suficientes para deixarmos de olhar para o espelho, para nos tomarmos pelo centro do universo, esquecendo que há mais mundo.
O comentário do primeiro volume progredia, e entretanto li, com outros olhos e mais atenção do que tinha feito antes, o posfácio dos responsáveis da edição crítica alemã. E na primeira página encontro a justificação para o aparecimento tardio desta edição portuguesa. Esta aparece – como aconteceu com a edição crítica original quando começou a sair em 1974 – para que se possa finalmente, em português, passar do «mero tactear no escuro» para o «passo seguro de uma ciência» na leitura dos textos e do aparato que os ilumina. A edição não ambiciona mais do que isso – e não é pouco.
Extraio ainda desse posfácio, sóbrio e rigoroso, duas ideias que servem à edição portuguesa em curso:
1. «Também no que à edição diz respeito, cada obra de Benjamin é, no sentido que ele deu ao termo, uma mónada». Isto é: tem uma autonomia que não permite o recurso a critérios rigidamente uniformes.
2. «A forma de um texto é tangencial à sua interpretação». Isto aplica-se, e muito, à tradução do texto e do aparato conceptual de Walter Benjamin, e é mais um argumento válido para a ausência de grandes ensaios de interpretação, de algum modo supérfluos quando o que se pretende é deixar falar os textos e a sua história.
Em cima: Manuscrito de W. B.
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