23 março, 2008

O POMAR GLOBAL


«Pode levar, menina, é pera-rocha do Oeste...» Parece ser apenas isto o que nos resta. A fruta que comemos tornou-se, como tantas outras coisas, o espelho do mundo globalizado em que vivemos. Longe vão os tempos das laranjas de Setúbal, dos pêssegos de Alcobaça, dos melões de Almeirim, das cerejas da Beira-Baixa, das alfarrobas algarvias, da uva D. Maria, do ananaz dos Açores, tudo na sua época própria. Hoje, é a manga e a papaia, o kiwi e os morangos, as nectarinas e as «golden» – tudo sem tempo nem lugar próprios, crescendo na estufa e amadurecendo na fruteira, que a árvore não pode esperar. Não há ritmos naturais nem biológicos, os relógios enlouqueceram, as estações travestizaram-se. Comemos os frutos insípidos do novo jardim do Éden, o pomar global, sem sequer termos direito a promessas de aventura ou ao gostinho a pecado fora do paraíso...

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