13 setembro, 2007

ARABESCOS


Uma noite de Lua cheia iluminou e revelou um mundo de arabescos naturais, nos rebentos de trepadeiras que se recortavam contra o céu negro. Mundo da deriva infinita, sem centro. Um labirinto sem Ariane, sem Teseu, sem Minotauro, feito só de formas e vibrações. Como o Amor sem objecto, só tensão, em Rilke; como o Objecto-de-Amor no misticismo sufi de Ibn-Arabi, fusão de todos os objectos e corpos do Amor fundidos em dois: a Mulher e deus. O arabesco é, no mundo árabe, um padrão interminável que se expande para lá do mundo visível e material, símbolo do infinito presente na criação do deus único (do amor total), e que por isso não tem centro. Não tem centro, mas terá fulcro, o ponto em que há acesso ao Uno nascido do diverso. O trabalho do arabesco – como o da caligrafia, sua irmã gémea e sua forma dotada de significação, também ela toda feita da energia do ser e do Amor nos grandes calígrafos – visa levantar alguns dos véus que nos separam da perfeição, e que podem esconder, não apenas uma inacessível divindade, mas a Objecto-de-Amor, não inacessível, mas insondável e sempre esquiva, figura que desaparece sob véus, mas sem nunca se apagar – como sugere a poesia místico-amorosa de Ibn Arabi. Do sagrado ao profano é apenas um passo – ou o desvio de um olhar. A Nizam do místico sufi, a mulher emblemática, é manifestação suprema de Alá, a sua expressão mais perfeita e múltipla. E é ela própria, na espiritualidade material do seu corpo.

De Ibn-Arabi (A Harmonia Perfeita), numa edição com belas caligrafias do iraquiano Hassan Massoudy:



O meu coração abriu-se
Para acolher toda a forma.
É pastagem de gazelas
E abadia de monges.

É templo para ídolos
E Kaaba para quem o percorre,
É as tábuas da Tora
E recebe os versículos do Corão.



Pergunta pela morada
Da mulher de corpo dócil.
Aquela que te faz ver o esplendor
Do Sol a nascer do seu sorriso.

E a minha versão escrita/dita dos arabescos lunares:

Sem comentários: